- Imagine! – dizia a mãe, uma estrela grande e brilhante.
- Isso é impossível !
- Imagine ! – exclamou o pai, um estrelão dos mais respeitados.
- Imagine! – repetia o sol, o chefe de todas as estrelas.
Mas o caso é que aquela estrela tinha medo do escuro. Ela ficava o tempo todo dentro das nuvens, com a luz acesa vendo televisão. Quando o sol ia dormir, ela apagava a luz e abria a porta da noite, por onde as estrelas deveriam entrar.
- Vamos – dizia a mãe da estrelinha.
- Vamos – repetiam as outras estrelas.
- Vamos! – ordenava o estrelão, com sua voz grossa.
Mas ela não ia. Ficava de luz acesa, às vezes chupando o dedo, com muito medo do escuro.
Então, chamaram a lua. A lua era assim muito jeitosa para falar com as estrelinhas. Sabia contar histórias. Sabia falar macio, numa voz que parecia música. E Ela foi falar com a estrela que tinha medo do escuro.
- Vamos? – chamou.
E chamou de um jeito doce. A estrelinha olhou pra lua. Mas não se mexeu.
- Olha – disse a lua. – Você é uma estrela. E as estrelas devem brilhar.
- Mas eu tenho medo do escuro! – disse a estrelinha.
- Mas o escuro é que foge de você – disse a lua.
- Como assim? – perguntou a estrelinha.
- Quer ver? – disse a lua.
E tomou a estrelinha pela mão e saiu do meio das nuvens e entrou pela porta da noite. A estrelinha ia andando e, como não podia deixar de brilhar, o escuro ia ficando cada vez mais longe. Quanto mais ela andava, para longe o escuro ia.
- Eu não disse? – falou a lua. - O escuro foge de você.
A estrelinha sorriu.
E não teve mais medo.
PACHECO,Antonio Carlo. Medo do Escuro.Ática.S.Paulo.1984.
A história Medo do Escuro, é bem semelhante a forma dos contos de fadas, ou seja, apresenta a unidade temática, a organização dos acontecimentos dos conflitos, a intervenção da lua, fada madrinha, que tudo acalma para que o bem prevaleça.
A história traz também a característica textual e as várias vozes dos contos de fadas: - Olha! Disse a Lua - Você é uma estrela. E as estrelas devem brilhar. - Mas eu tenho medo do escuro! - disse a estrelinha.
Nesse sentido, o Medo de Escuro, organiza-se de forma coerente apresentando continuidade e adequação ao tema.
O emprego do "então" é articulado de forma bem coesiva, dando a história um encadeamento coerente dos fatos tecidos pelo autor. Outro aspecto do texto é o tom moralizante que está expresso nas entrelinhas. (...) "E tomou a estrelinha pela mão e saiu do meio das nuvens e entrou pela porta da noite." (...) " eu não disse? - falou a lua." E desta forma a estrelinha perdeu o medo do escuro e a lua realizou seu desejo, pelo convencimento e transgressão as regras familiares.
Acredita-se que histórias em especial, os contos de fadas, possuem características que favorecem as crianças a construção de um conteúdo e forma para suas produção orais e escritas.
O contéudo imaginativo dessa literatura, geralmente, é do interesse das crianças. O fascínio pelas transformações mágicas, pelo sobrenatural, pelo insólito é uma necessidade que a criança tem de vez por outra escapar de si mesma, através da literatura, colocando-se na pele de algum personagem, animal ou um objeto.
Assim, a temática presente nos contos de fadas pode despertar a lição social-pedagógica instaurada entre os seres e as coisas, um modo de relação que transcede a lógica adulta, mas que vem ao encontro dos desejos, expectativas e sonhos das crianças.
O "Era uma vez" constitui-se no "Abracadabra", "Pé-de-cabra" de um universo de liberdade onde tudo pode acontecer, tudo é possivel e impossível.
Nessa perspectiva, os contos de fadas favorecem o trançar e tecer das histórias, contribuindo substancialmente para uma produção oral e escrita, mais efetiva, no sentido de promover um conteúdo para configurações textuais que as crianças possam vir a produzir.
Referências Bibliográficas:
> BETTELHEIM, Bruno. Psicanálise da Alfabetização. Artes Médicas, 1984.
> FRANCO, Ângela. Construtivismo: Uma ajuda ao professor. Editora Lê. Belo Horizonte. 1997.
> NEGRINE, Airton. Aprendizagem e Desenvolvimento Infantil. Editora Prodil. Porto Alegre. 1994.
> ROSA, Nereide S. Santa. A arte de olhar crianças. Scipione. São Paulo. 2002.
> ALMEIDA, Theodora Maria Mender de. Brincar, jogar, contar e cantar: 77 jogos para as crianças. Editora Caramelo. São Paulo. 2004.
> BUORO, Anabella Buenos. Olhos que pintam: a leitura da imagem e o ensino da arte. Editora Cortez. São Paulo. 2002.
> QUEIRÓS, Bartolomeu Campos de. Diário de classe. Editora Moderna. São Paulo. 1992.
> SOUSA, Maurício de. Manual da roça do Chico Bento/ Manual de Brincadeiras da Mônica. Editora Globo. São Paulo. 2003.
> PACHECO, Antonio Carlo. Medo do Escuro. Ática. São Paulo. 1994.